Vitalik: Quando o open source se torna dominante, por que deixo de lado licenças permissivas e passo a adotar o copyleft?

intermediário7/25/2025, 11:13:56 AM
O artigo analisa como as licenças permissivas ampliam a distribuição de obras e contribuem para minimizar disputas de direitos autorais, além de abordar o papel essencial das licenças copyleft no avanço da adoção de tecnologias e na preservação dos princípios do open source.

No universo do software livre e de código aberto — e, de maneira mais ampla, do conteúdo livre — as licenças de direitos autorais costumam ser divididas em duas grandes categorias:

  • Se um conteúdo for disponibilizado sob uma licença permissiva (como CC0 ou MIT), qualquer pessoa pode acessar, utilizar e redistribuir esse conteúdo sem restrições, desde que respeite requisitos mínimos, como a devida atribuição.
  • Se o conteúdo for publicado sob uma licença copyleft (como CC-BY-SA ou GPL), também é permitido acessar, usar e redistribuir cópias livremente. Contudo, quem criar e distribuir trabalhos derivados — ao modificar ou combinar o original com outras obras — deve liberar essas novas criações sob a mesma licença. Além disso, a GPL exige que todo trabalho derivado disponibilize seu código-fonte e cumpra outras exigências específicas.

Em resumo: licenças permissivas permitem compartilhamento irrestrito com a sociedade, enquanto licenças copyleft só autorizam compartilhamento entre aqueles igualmente comprometidos com a abertura.

Desde criança, sou tanto entusiasta quanto desenvolvedor de software e conteúdo livre e aberto, movido pela paixão de criar ferramentas e recursos que considero úteis para todos. Anteriormente, eu preferia licenças permissivas (por exemplo, meu blog utiliza a licença WTFPL); no entanto, recentemente passei a adotar o modelo copyleft. Este artigo detalha por que mudei de perspectiva.

A licença WTFPL representa uma visão possível de liberdade no software, mas está longe de ser a única alternativa.

Por que Antes Preferia Licenças Permissivas

No início, meu objetivo era ampliar ao máximo o alcance do que eu produzia, e as licenças permissivas deixam claro que qualquer pessoa pode criar trabalhos derivados sem preocupação com restrições, tornando-as ideais para isso. A maior parte das empresas reluta em abrir seus projetos gratuitamente, e reconheço que não é possível forçá-las a aderir integralmente ao movimento de software livre. Busquei evitar conflitos desnecessários com práticas já estabelecidas nessas empresas.

Filosoficamente, sempre fui contrário ao direito autoral (e a patentes). Não aceito que duas pessoas compartilhem dados privadamente e, por isso, sejam consideradas criminosas perante um terceiro. Elas não interagem nem retiram nada desse terceiro (afinal, “não pagar” não é o mesmo que “roubar”). Por diversas razões legais, declarar explicitamente uma obra em domínio público costuma ser dificultoso. Assim, licenças permissivas são o caminho mais puro e seguro para aproximar-se de uma postura “sem reivindicações de direitos autorais”.

Admiro o conceito de “combater o direito autoral usando o próprio direito autoral” do copyleft — uma inovação legal brilhante. Em parte, esse conceito reflete o liberalismo político que tanto prezo. Como doutrina política, o liberalismo veda o uso da força salvo para proteger contra danos. Como princípio social, representa civilizar a rejeição ao dano tratando a liberdade como um valor sagrado e tornando sua violação inaceitável. Mesmo que alguém se incomode com as escolhas voluntárias de terceiros, não pode interferir — pois invadir a privacidade de pessoas livres é, por princípio, errado. Portanto, historicamente há precedentes para rejeitar o direito autoral e a coexistência do “uso do direito contra si mesmo”.

Contudo, embora o copyleft para obras literárias se encaixe nesse ideal minimalista, as exigências da GPL para código-fonte vão além: ela impõe a divulgação do código por força do próprio direito autoral. Isso atende ao interesse público, não à busca de lucro direto por licenciamento, mas ainda é uma utilização assertiva do direito autoral. Em licenças ainda mais rígidas, como a AGPL, vai além: mesmo se o trabalho derivado for utilizado apenas via Software como Serviço (SaaS) e não for disponibilizado publicamente, a divulgação do código-fonte segue obrigatória.


Diferentes licenças open source impõem obrigações distintas de divulgação de código-fonte em trabalhos derivados, algumas exigindo abertura em múltiplos cenários.

Por que Agora Prefiro Copyleft

Minha mudança de permissivo para copyleft se baseia em duas transformações na indústria e em uma revisão do meu entendimento filosófico.

Primeiro, o open source se tornou predominante, tornando mais viável incentivar empresas a abrirem seus códigos. Hoje, gigantes da tecnologia — como Google, Microsoft, Huawei e outras — não apenas adotam, mas impulsionam ativamente o desenvolvimento de software aberto. Em setores como inteligência artificial e criptomoedas, a dependência de open source já ultrapassa qualquer segmento anterior.

Em segundo lugar, a concorrência no mercado cripto tornou-se muito mais intensa e voltada ao lucro. Já não podemos contar somente com a boa vontade dos desenvolvedores para liberar códigos. Fomentar o open source passa, agora, menos por apelos éticos (“por favor, abra seu código”) e mais pelos “mecanismos de pressão” do copyleft, que limitam o acesso ao código àqueles que também o compartilham abertamente.

Se representarmos como essas forças aumentam o valor do copyleft, o cenário seria assim:

Em ambientes nos quais o open source não é totalmente inviável nem inevitável, os incentivos à abertura produzem maior impacto. As áreas corporativa e cripto atuais se encaixam nesse perfil, tornando o copyleft um incentivo muito mais poderoso do que antes.

(Nota: O eixo horizontal representa a motivação para abrir o código; o vertical, a probabilidade. Os gráficos ilustram como o copyleft potencializa hoje a sinergia entre motivação e adoção em organizações tradicionais, enquanto o amadurecimento do ecossistema cripto gera retornos marginais decrescentes — evidenciando como a lógica do copyleft evolui conforme o setor muda.)

Terceiro, teorias econômicas como as de Glen Weyl me convenceram de que, onde há retornos superlineares de escala, a melhor política não é um sistema rígido de direitos de propriedade — como propõem Rothbard/Mises —, mas sim promover mais abertura do que naturalmente ocorreria.

Em essência, se existem economias de escala, o básico da matemática nos mostra que a falta de abertura leva inevitavelmente ao domínio de um ator. Economias de escala significam que, se controlo o dobro dos recursos que você, terei um ganho mais do que dobrado em relação a você. No ano seguinte, terei 2,02 vezes seus recursos, e o distanciamento só cresce —


À esquerda: com crescimento proporcional, pequenas diferenças iniciais permanecem pequenas; à direita: com economias de escala, até minúsculas diferenças rapidamente se ampliam.

Historicamente, quem freou esse desequilíbrio foi o avanço inexorável do progresso. Com a mobilidade de talentos entre empresas e nações, ideias e habilidades se disseminavam; países menos desenvolvidos avançavam via comércio; a espionagem industrial impedia monopólios indefinidos.

Recentemente, porém, várias tendências vêm enfraquecendo esses freios e acentuando desequilíbrios de poder:

  • O avanço tecnológico acelerou de modo superexponencial, com ciclos de inovação cada vez menores.
  • A instabilidade política aumentou em diversos países e entre eles. Quando a proteção a direitos é robusta, o progresso externo causa pouco risco; já em ambientes instáveis, a concentração de poder oferece sérios perigos. Paralelamente, o apetite dos governos para regular monopólios diminuiu.
  • Softwares e hardwares modernos estão mais fechados; ao contrário dos produtos tradicionais, que permitiam engenharia reversa e acesso à tecnologia, hoje muitos produtos proprietários dão apenas direito de uso, mantendo controle e modificações restritas.
  • Os limites naturais ao tamanho das organizações estão desaparecendo: se antes a complexidade organizacional e demandas locais limitavam o crescimento, as tecnologias digitais agora permitem uma escala e controle inéditos.

Essas tendências estão ampliando — e por vezes agravando — os desequilíbrios de poder entre empresas e nações.

Por isso, acredito cada vez mais que serão necessárias medidas assertivas para incentivar ou obrigar a difusão tecnológica.

Novas políticas públicas ao redor do mundo podem ser vistas como intervenções mandatórias para promover a disseminação tecnológica:

  • Diretivas de padronização da União Europeia (como a obrigatoriedade do USB-C), voltadas a desmontar ecossistemas fechados e contrários à interoperabilidade;
  • Políticas de transferência tecnológica compulsória na China;
  • Proibição de acordos de não concorrência nos Estados Unidos (das quais sou favorável, pois forçam empresas a “abrir parcialmente” segredos industriais via mobilidade da força de trabalho, já que acordos de confidencialidade (NDAs) raramente são aplicados na prática).

Em minha visão, o principal problema dessas políticas é seu viés estatal, que tende a priorizar caminhos de difusão alinhados a interesses políticos ou empresariais locais. Por outro lado, o benefício é claro: essas medidas realmente aceleram a disseminação de tecnologia.

Já o copyleft, por outro lado, constrói um imenso repositório de código (ou outras obras criativas) que só pode ser utilizado se o usuário também liberar suas versões derivadas como open source. Assim, o copyleft serve como incentivo neutro e universal à difusão tecnológica, trazendo vantagens similares a políticas públicas sem muitos de seus inconvenientes. Sua neutralidade vem do fato de não favorecer nenhum grupo em particular, tampouco exigir gestores centrais para ajustes.

Naturalmente, estas conclusões não são absolutas. Em contextos onde “máxima disseminação” é o objetivo, licenças permissivas continuam tendo relevância. Mas, em geral, o copyleft hoje oferece um valor combinado muito superior ao de quinze anos atrás. Projetos que antes optaram por permissivo deveriam pelo menos considerar migrar para copyleft atualmente.


Infelizmente, o conceito de “open source” já se distanciou bastante do sentido original. Ainda assim, no futuro, poderemos ver veículos open source — e o hardware copyleft pode ser fundamental para viabilizar essa realidade.

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